quarta-feira, 26 de junho de 2013

Plebiscito para reforma política

Sou a favor do plebiscito - não para convocar nova constituinte -, mas para definir o que o queremos. Mas muita atenção: na prática, é um jogo de sim ou não; portanto, as perguntas devem ser claras e diretas, a fim de evitar interpretações divergentes, bem como amplamente debatidas e divulgadas com antecedência.

Com o plebiscito sobre os pontos da reforma política, não corremos o risco da formação de uma assembleia, a qual estaria sujeita a sofrer dos mesmos males que afligem o parlamento. Embora eu pense que a agora famosa crise de representatividade corresponda a uma arraigada e duradoura crise de cidadania majoritária, já que depois dos gritos tivemos: redução das passagens, rejeição da PEC 37, corrupção como crime hediondo, royalties pra saúde e educação, CPI dos ônibus - e ainda estamos na quarta-feira. Para essa semana ainda, quero a instituição do imposto sobre grandes fortunas, que tá lá na Constituição, no artigos 153, inciso VII, desde 1988 (é só 6 anos mais novo que eu - tenho 30), mas depende da edição lei complementar para ser aplicado. Quase convocaram uma nova constituinte sem regulamentá-lo...

Bom, voltando ao plebiscito, poderemos decidir diretamente, não sofrendo tanto com a crise de representatividade; digo “tanto” porque há sempre um espaço entre a decisão popular  - respostas a um questionário simples - e o texto final.

Seria ótima a criação de um site do governo aberto a sugestões, como se fosse uma prévia virtual, o que acho viável.

Por fim, deixo aqui algumas sugestões sobre os pontos:

Voto facultativo; voto distrital; financiamento público de campanha; possibilidade de candidatar-se mesmo sem filiação partidária; chamamento (recall ou “que você tá fazendo aí infeliz, volta aqui porque não foi isso que você prometeu”); fidelidade partidária; cláusula de barreira; e eleição para os ministros do STF e STJ (exigindo-se mais de 10 anos de carreira, vindo do MP, OAB e magistratura).



A nova constituinte e o canto das sereias


Parece que já desistiram da constituinte, mas, de qualquer modo, deixo aí uma comparação; a ideia não é minha, mas o texto é.

Conhecem a Odisseia, de Homero? Bom, simplificando muito, é a estória do retorno de Odisseu (Ulisses) à sua terra, depois da Guerra de Troia. Pra entender o drama: ele passou 20 anos longe de casa (Ítaca), da esposa (Penélope) e do filho, somando o tempo da guerra com o da viagem de volta.

Durante o retorno, teve que passar pelas sereias, cujo canto era mortal. Malandro que era, Odisseu disse aos seus companheiros que tapassem os ouvidos com cera amolecida. Mas nosso herói - adepto de fortes emoções - queria se deleitar com o canto das sereias, sem ser atraído à morte; para tanto, pediu que o amarrassem ao mastro da embarcação e só o libertassem depois que estivessem longe das sereias - mesmo que ele implorasse. Assim foi feito. Odisseu ouviu o canto, sem correr os riscos.

Algumas normas constitucionais correspondem a essas amarras, chamamos isso de autocontenção. O povo, verdadeiro titular do poder, escolheu, num processo belíssimo e participativo de reabertura, a assembleia constituinte que criou nossa Constituição de 1988. Ali, o povo, como Odisseu, amarrou-se a alguns pontos essenciais, previstos no § 4º do artigo 60: os direitos e garantias fundamentais; a forma federativa de Estado; o voto direto, secreto, universal e periódico; e a separação dos Poderes. 

Assim, ainda que, sob forte influência, o povo queira se livrar deste compromisso consigo mesmo, as cordas estão ali e os verdadeiros camaradas cumprem o combinado; por mais que as sereias cantem e seduzam, o melhor é não mexer na autocontenção.

A convocação de uma nova constituinte não é só perigosa pela possibilidade de supressão de direitos. A ideia por si só é muito arriscada. Explico: há uma crise de representatividade, parece que a maioria não concorda com a atuação dos parlamentares; assim, o que garante que, ao eleger os tais componentes da nova constituinte, escolheremos representantes melhores? E mais: hoje é a Dilma, do PT, e o momento é de manifestações populares. Amanhã, poderá ser Fulano, de um partido esquisito, num contexto de fúria elitista. E aí?

Há um dado importante que não está sendo considerado nesse papo de nova constituinte. As emendas constitucionais podem ser apreciadas pelo STF, o qual exerce o famoso controle de constitucionalidade, que é simplesmente verificar se o texto da emenda ou lei viola algum dos alicerces da Constituição.

Desta forma, as questões que se colocam são: o texto de uma nova constituinte poderá ser apreciado pelo STF? Ou por ser originário, não poderá ser objeto de controle de constitucionalidade? A constituinte seria parcial - restrita a pontos preestabelecidos -, caso ultrapassasse esses limites, quem exerceria algum controle?

Portanto, mesmo na hipótese absurda de uma nova constituinte, entendo que o STF poderá apreciar o texto final, a fim de assegurar que a reforma não poderá abolir os pontos fundamentais mencionados acima, e que não poderá sair um milímetro dos limites prefixados.

Já pensaram no assunto?







quinta-feira, 20 de junho de 2013

Transporte público: Estado mínimo, lucro máximo

De acordo com o discurso vigente, os empreendimentos públicos devem buscar investimentos na iniciativa privada; desta forma, o Estado deve delegar a empresas a prestação de serviços públicos, reservando para si somente o poder de regulamentar e fiscalizar os serviços.

O principal argumento dos que defendem a redução do papel do Estado é a diminuição dos gastos: a cessão do espaço e/ou prestação do serviço público a empresas alivia os cofres públicos, ou seja, a iniciativa privada paga para assumir a administração da área/serviço - o que evitaria ou, pelo menos, compensaria os gastos públicos.

Mas na realidade não é assim.

Isso porque, quem arca com as despesas é o usuário do serviço, uma vez que a empresa responsável pela gestão cobra tarifas, para cobrir o seu dispêndio e lucrar com a prestação do serviço. 

E não há certeza sobre os gastos e os lucros - e não haverá enquanto inexistir transparência.

Portanto, devemos exigir transparência quanto aos contratos vigentes, com a apresentação das planilhas com o LUCRO dos empresários; nelas, deve ser incluído o lucro com a PUBLICIDADE (bus door, tvs internas etc.), já que a exploração do serviço não se limita ao valor das passagens. A cada viagem de ônibus e barca somos bombardeados com propagandas (até nas cadeiras!) e não sabemos pra onde vai esse dinheiro.

Transporte com tarifas baixas não dão lucro e, portanto, não interessam à iniciativa privada, "patrocinadora" - indispensável? - do Poder Público.

O discurso dos governantes está invertido: o responsável pela prestação dos serviços públicos é o Estado. Isso está na nossa Constituição, artigo 175. A delegação do serviço à iniciativa privada é uma opção (sim, o Estado pode prestá-lo diretamente), que só se justifica quando tem por finalidade o interesse público. Resumindo: é pra servir - e muito bem - ao cidadão e não pra encher os bolsos de uns poucos.

A tarifa é alta, pagamos muito; motoristas, trocadores, mecânicos etc. ganham pouco. Parece que só os empresários estão satisfeitos. A redução da passagem já foi conquistada; agora, falta a transparência, para que a conta seja paga com o lucro e não com "cortes orçamentários".