Inicialmente
rejeitado por grande parte da sociedade (como o samba foi no
passado), o Funk carioca ganhou seu espaço. Nesse processo de
assimilação, expansão e comercialização, percebem-se muitas
mudanças no movimento, que, a meu ver, afetam a sua própria
definição.
Sem me aprofundar nas razões e peculiaridades deste processo de difusão, nem na definição do movimento, o fato é que, ao longo de três décadas, o funk passou de desconhecido a protagonista.
Sem me aprofundar nas razões e peculiaridades deste processo de difusão, nem na definição do movimento, o fato é que, ao longo de três décadas, o funk passou de desconhecido a protagonista.
A
música popular parece seguir esse caminho: costuma nascer à margem
da sociedade e, posteriormente, se expande, por meio de alguns
ícones, que são cruciais à propagação e assimilação dos novos
gêneros.
Como exemplo deste processo no caso do funk, podemos observar as músicas de Claudinho e Buchecha: há uns 15 anos, era impossível imaginá-las incluídas na programação de certas rádios voltadas ao público de classe média; no entanto, gravadas por outros artistas, passaram a tocar nessas rádios com frequência.
Como exemplo deste processo no caso do funk, podemos observar as músicas de Claudinho e Buchecha: há uns 15 anos, era impossível imaginá-las incluídas na programação de certas rádios voltadas ao público de classe média; no entanto, gravadas por outros artistas, passaram a tocar nessas rádios com frequência.
Assim
como ocorreu na origem do Samba - com todos os elementos que o
compõe, como os instrumentos, a dança, o meio etc. -, o funk também
foi associado à marginalidade. Do mesmo modo, a história do blues,
o rock, o reggae.
Este
último só foi divulgado e assimilado mundialmente quando Eric
Clapton gravou B. Marley. Pioneiro, o Led Zeppelin, em 73,
lançou D'yer Mak'er, reggae cujo título soa intencionalmente como
Jamaica e que levou anos para ser aceito pela crítica. Em 78, Mick
Jagger tocou com Peter Tosh (Don't lock back). Por aqui, Gil
se encarregou de difundir o novo som.
O curioso é que Gil, anos antes, participou da passeata contra contra a guitarra, fato que também serve para ilustrar o processo de rejeição e posterior incorporação. Nesse sentido, a essência do movimento tropicalista, que admitia beber de muitas fontes e, misturando à cultura nacional, criar algo novo. Um "rabo de galo" estético-cultural.
Para mim, trata-se de admitir o óbvio, já que não acredito em pureza na música: sempre há mistura e transformação, que alteram o objeto original.
O curioso é que Gil, anos antes, participou da passeata contra contra a guitarra, fato que também serve para ilustrar o processo de rejeição e posterior incorporação. Nesse sentido, a essência do movimento tropicalista, que admitia beber de muitas fontes e, misturando à cultura nacional, criar algo novo. Um "rabo de galo" estético-cultural.
Para mim, trata-se de admitir o óbvio, já que não acredito em pureza na música: sempre há mistura e transformação, que alteram o objeto original.
Pra
provar a inexistência de pureza, diz a lenda que os jamaicanos, em
meados do séc. XX, sintonizavam rádios do sul dos EUA, e daí,
misturando música caribenha com norte-americana - ambas com forte
influência africana -, surgiu o reggae.
E, tempos depois, foi a vez do reggae visitar os EUA, influenciando bandas como Sublime, que o regurgitaram com um rock mais contemporâneo.
Isso sem falar que o rap surgiu na Jamaica, o que pouca gente sabe. O DJ jamaicano Kool Herc é considerado o responsável por levar o rap aos EUA, mais especificamente a Nova Iorque, entre as décadas de 60 e 70.
E, tempos depois, foi a vez do reggae visitar os EUA, influenciando bandas como Sublime, que o regurgitaram com um rock mais contemporâneo.
Isso sem falar que o rap surgiu na Jamaica, o que pouca gente sabe. O DJ jamaicano Kool Herc é considerado o responsável por levar o rap aos EUA, mais especificamente a Nova Iorque, entre as décadas de 60 e 70.
Mas voltando à nossa música marginal da atualidade, penso que, guardadas as devidas proporções, Anitta está para o funk, como Elvis, para o rock.
É comum o discurso de que o funk carioca é uma simples importação, uma cópia bruta e mal acabada do miami bass norte-americano. Mas, observando-se o movimento, não dá pra negar a atuação da "antropofagia", ressaltando-se que o tempo é imprescindível para uma boa digestão.
Mesmo o modo de cantar que, em algumas músicas, se aproxima bastante da fala, é uma característica interessante. Quando vemos a arte pós-moderna mexendo com os suportes e deslocando os objetos de suas funções, a letra, falada, sobrepondo-se ao ritmo, pode ser repensada.
Quanto à dança, é bem interessante a mistura. Se pararmos para observar e refletir, veremos que o agora famoso quadradinho representa uma verdadeira transgressão, na medida em que insere pausas e aproxima o rebolado - que é essencialmente arredondado, até no termo - a um movimento em ângulos retos, robótico, vinculando-o às batidas eletrônicas, as quais espelham o ritmo de produção industrial (linha de montagem).
Verdadeiro desafio à física clássica, o quadradinho consegue realizar a quadratura do círculo, ao compasso do funk, violando regras e dispensando réguas. O que os físicos não se deram conta é que quadrados e círculos só podem se aproximar quando em movimento. O estudo das formas puramente estáticas foi superado.
Não é de hoje que parte de nossa dança nos virou às costas e a bunda passou a protagonizar a cena. Ao samba, funk e axé, juntou-se a influência da breakdance, que, embora encarada por muitos só como um jeito norte-americano de dançar, não deixa de ser também africana e latina, vez que surgiu nos guetos de grandes cidades dos EUA. Nesse contexto, o quadradinho parece ser a união do nosso rebolado com o break, uma espécie de square ball action, ou melhor, squarebolation.
Diante do exposto, creio que o quadradinho é, na verdade, o pós-rebolado.
PS. Para
entender melhor a origem funk e observar como foi ignorado a princípio,
sugiro a leitura da dissertação de mestrado sobre o baile funk
carioca, de Hermano Paes Vianna Jr., disponibilizada pelo autor
em http://www.overmundo.com.br/banco/o-baile-funk-carioca-hermano-vianna.
Pena que é antiga. Não sei se há algum livro recente e bom sobre o
assunto. São bem-vindas sugestões.
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