Trecho do artigo (TCC da pós-graduação em Direito Público):
De acordo com as
informações obtidas nos principais veículos de comunicação1,
verifica-se que, a partir do segundo semestre de 2015, estudantes
secundaristas da rede pública de ensino deram início à ocupação
das escolas.
Em São Paulo, onde
começou o aludido movimento, os alunos, a princípio,
manifestaram-se contra o que se chamou de “reorganização
escolar”, plano que o Poder Executivo do estado paulista pretendia
implementar, com mudanças radicais no ensino público, remanejando
alunos e funcionários, de modo a reduzir o número de colégios,
concentrando em determinados locais as unidades de educação, com o
consequente fechamento de diversas escolas.
O projeto do Governador
Geraldo Alckmin (PSDB/SP) objetivava transferir trezentos mil alunos
e fechar noventa e dois colégios. Tais medidas, evidentemente,
dificultariam o acesso de milhares de estudantes à rede de ensino
público e gratuito do Estado.
O movimento dos alunos de
São Paulo se inspirou na experiência dos secundaristas chilenos, os
quais ocuparam centenas de escolas no ano de 2006, a fim de
reivindicar passe livre e melhoria da educação pública. A
manifestação no Chile, que ficou conhecida como “revolução dos
pinguins” (referência ao uniforme escolar no país), levou à
criação do manual “como ocupar um colégio?”, que orientou a
manifestação dos estudantes brasileiros.2
Inicialmente, os alunos
paulistas, acompanhados de seus pais e professores, protestaram
contra o plano do governo estadual por meio de passeatas. No entanto,
como as manifestações não estavam atingindo o resultado esperado,
já que o governo continuou distante do diálogo, os secundaristas
decidiram ocupar escolas, seguindo as instruções da cartilha
chilena.
Percebe-se que a ocupação
das escolas é uma estratégia de mobilização que surge como
alternativa às passeatas e manifestações em ruas e praças. Tendo
em vista que os meios de protestos mais tradicionais se mostraram
ineficazes e até perigosos - diante da truculência da polícia -,
os alunos decidiram ocupar as unidades de ensino, de modo pacífico.
É importante ressaltar
que surgiram na mídia diferentes descrições sobre o protesto
objeto do presente trabalho. Há reportagens e editoriais que afirmam
que a ocupação das escolas foi controlada por movimentos sociais e
sindicatos de professores da rede pública.3
Todavia, em ampla
pesquisa em diversos meios de comunicação, prevalece a versão de
que o corpo discente teria o protagonismo na organização das
manifestações, não sendo demonstradas provas ou mesmo evidências
de que houve manipulação dos alunos por outros grupos. Além
disso, sem afastar do tema, é interessante mencionar que as grandes
empresas da mídia nacional não são bons exemplos de imparcialidade
e isenção, como salientado no artigo “Quando a mídia toma
partido”.4
As narrativas construídas
na mídia muitas vezes se afastam dos fatos, como, por exemplo, na
criminalização do Funk, que deixaram os cadernos de cultura
passando para os de polícia. O movimento Funk, da periferia carioca
foi equivocadamente associado ao que os grandes jornais chamaram-se
“arrastão”, com hordas de assaltantes. Apenas muitos anos depois
é que a verdade veio à tona, não houve vítimas, não houve
feridos, apenas furto de uma tolha e de um par de sandálias5.
Da mesma forma, a maior parte das empresas de mídia sustenta
discurso criminalizante em relação à ocupação das escolas.
No que se refere ao
Estado do Rio de Janeiro, o movimento dos alunos começou no primeiro
semestre de 2016, inspirado na divulgação das ocupações em São
Paulo, diante de um quadro de crise, com atraso no pagamento de
professores e funcionários, com ampla adesão à greve e dificuldade
de diálogo com o Poder Público.6
Constata-se que nos dois
estados - São Paulo e Rio de Janeiro -, os manifestantes
reivindicavam a melhoria na prestação do serviço público,
apresentando propostas de valorização do ensino e de maior
participação do corpo discente na administração das unidades.
Não há como negar que o
modelo neoliberal vem atingindo direitos, como afirma MARQUES NETO
(2004, p. 104):
...
o assim denominado modelo neoliberal, que se vem impondo
avassaladoramente em escala mundial, tende a um esvaziamento dos
direitos que gradativamente se foram incorporando ao patrimônio
jurídico dos sujeitos, considerados tanto sob o prisma individual
quanto coletivo; e, nesse sentido, se movimenta em sentido contrário
à tendência de acumulação de direitos e ampliação de espaços
de reivindicação e de exercício de cidadania, que caracterizou
estes últimos dois séculos no ocidente.
Diante das medidas
anunciadas pelo governo estadual de São Paulo bem como da desordem
do ensino público no Rio de Janeiro, a mobilização dos estudantes
surgiu como resposta, em uma clara tentativa de resguardar direitos
que vêm sendo diluídos por políticas de cortes e crescentes
privatização e precarização de serviços essenciais e prestações
positivas do Estado, as quais se relacionam à promoção da
igualdade material (direitos fundamentais de segunda dimensão)7.
____________________________________________
1 Reportagem do G1. Disponível em < http://g1.globo.com/sao-paulo/escolas-ocupadas/noticia/2015/12/virada-ocupacao-celebra-suspensao-de-reorganizacao-de-escolas-em-sp.html>. Acesso: 1º setembro. 2016. Reportagem da Agência Brasil – EBC. Disponível em.
Acesso: 30 agosto. 2016. Reportagem do El País. Disponível em
.
Acesso 31 agosto. 2016.
1 Reportagem do G1. Disponível em < http://g1.globo.com/sao-paulo/escolas-ocupadas/noticia/2015/12/virada-ocupacao-celebra-suspensao-de-reorganizacao-de-escolas-em-sp.html>. Acesso: 1º setembro. 2016. Reportagem da Agência Brasil – EBC. Disponível em
2Reportagem
da Folha de São Paulo. Disponível em
.
Acesso: 1º outubro. 2016.
3Opinião
publicada Revista Época. Disponível em
.
Acesso: 12 outubro. 2016.
4Artigo
acadêmico de Vera Chaia. Disponível em
<http://www.opiniaopublica.ufmg.br/emdebate/SETEMBRO_1.pdf#page=22>.
Acesso: 12 outubro. 2016.
5Janaína
Medeiros. Funk Carioca: crime ou cultura. O som dá medo. E
prazer.pág. 54.1 ed. São Paulo. Editora Terceiro Nome, 2006
6Reportagem
do El País. Disponível em
.
Acesso: 1º outubro. 2016.
7Daniel
Sarmento
afirma: “As
Constituições do México (1917) e de Weimar (1919) trazem em seu
bojo novos direitos que demandam uma contundente ação estatal para
sua implementação concreta, a rigor destinados a trazer
consideráveis melhorias nas condições materiais de vida da
população em geral, notadamente da classe trabalhadora. Fala-se em
direito à saúde, à moradia, à alimentação, à educação, à
previdência etc. Surge um novíssimo ramo do Direito, voltado a
compensar, no plano jurídico, o natural desequilíbrio travado, no
plano fático, entre o capital e o trabalho. ODireito do
Trabalho, assim, emerge como um
valioso instrumental vocacionado a agregar valores éticos ao
capitalismo, humanizando, dessa forma, as até então tormentosas
relações jus laborais. No cenário jurídico em geral, granjeia
destaque a gestação de normas de ordem pública destinadas a
limitar a autonomia de vontade das partes em prol dos interesses da
coletividade.” SARMENTO, Daniel. Direitos
Fundamentais e Relações Privadas.
2ª Edição, Rio de Janeiro : Editora Lumen Juris, 2006, p. 19.
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